(Foto da internet)
DISTRAÇÃO
Filemon Martins
Há certos fatos que acontecem no ambiente de trabalho tanto nas
empresas públicas, como nas empresas privadas, que são estranhíssimos. Esse
ocorreu numa empresa privada quando eu trabalhava como encarregado no setor de cobranças
de assinaturas, ligado ao Departamento de Créditos e Cobranças do jornal Folha
de S. Paulo, cujo gerente era o Sr. João Arci Netto, de saudosa memória.
Naquela época a tecnologia sequer engatinhava, havia as máquinas
de escrever, máquinas de calcular manuais (com manivela). Depois é que vieram
as máquinas elétricas que ajudaram bastante, mas até aí o trabalho era feito de
forma manual e assim, quase sempre sobrava trabalho, que deveria ser feito a
qualquer custo.
O gerente me ligava sempre na sexta-feira e dizia: - Filemon,
veja quem tem disponibilidade para vir trabalhar no sábado, anote os nomes com
seus números funcionais e me passa a lista. Assim era feito: perguntava a todos
que queriam aumentar sua renda com o trabalho de sábado, com horário das 8 às
12h, anotava seus nomes e encaminhava ao gerente que, após conferência, enviava
ao setor de pagamento do Departamento Pessoal.
E isso era feito todas as sextas-feiras religiosamente. Numa
sexta-feira qualquer fiz a lista e passei para o gerente. No sábado fomos à
empresa e trabalhamos normalmente. Na segunda-feira assim que assumi meu posto,
o gerente me telefona e diz: - Filemon, pode vir até minha sala? - Sim,
respondi e fui até lá. Ao entrar na sala do João, ele me disse: - na
sexta-feira eu pedi a lista do pessoal que viria trabalhar no sábado, mas não
havia nenhuma mulher. Mandei recolher os cartões e vejo que pelo menos uma
mulher veio trabalhar no sábado. Qual a explicação? Disse-lhe que havia algum
engano, porque nenhuma mulher veio no sábado. Já esticando a mão, ele me passou
os cartões e a lista me dizendo: - resolve isso pra mim. Fui averiguar o que
havia acontecido: de fato o cartão de uma moça estava registrado o horário de
entrada e saída. A conferência continuou e checando o nome da lista com os
cartões, descobri que um funcionário havia trabalhado conosco no sábado, mas
seu cartão estava em branco. Eureka, aqui está o problema. Não é que esse
funcionário distraído, muito distraído mesmo, pegou o cartão da moça chamada
Maria de Fátima, nada a ver com o nome dele, foi até o relógio e bateu o cartão
de ponto dela. Trabalhou, trabalhou até ao meio dia, quando encerrou o
expediente. Foi até a chapeira, pegou de novo o cartão da moça, foi até o
relógio e registrou o horário de saída, sem contudo perceber que não era o seu
cartão. Fiquei imaginando em que circunstância ele teria trabalhado, será que
estava com algum problema? Seria distração ou falta de tirocínio? A par do
ocorrido, voltei a conversar com o gerente, que ficou a ponderar: - Filemon,
até que ponto eu posso confiar no trabalho de quem não lê o seu próprio nome?
Ele trabalhou durante quatro horas, voltou à chapeira e cometeu o mesmo engano.
- Difícil responder, emendei, mas concordamos em conversar com ele sobre isso e
a partir dali ficaríamos mais atentos às tarefas executadas por ele. Não foi
fácil livrá-lo da dispensa, mas desta vez ele escapou. Não sei, porém, se
aprendeu a lição.
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