QUANDO O OUTONO CHEGA...

 

QUANDO O OUTONO CHEGA...

Filemon Martins



Quase fim de verão. Esta estação me fascina. A natureza faz o seu espetáculo com sua paisagem. Folhas e flores voam ao sabor dos ventos e misturam as cores da terra e do céu. São quaresmeiras, murtas, ipês, primaveras e resedás enfeitando as cidades e os jardins.

Em silêncio fico a pensar, sentir e ver que a natureza cria e recria lindas paisagens, desafiando a dureza dos corações humanos. Um sentimento agridoce toma conta do meu coração. Leio as manchetes dos jornais. A violência domina o mundo. A obsessão pelo poder é cada vez maior. A pandemia tem castigado a população, uma parcela porque fica doente e às vezes até perde a vida. Outra, porque perde seus empregos e não tem como sobreviver. Há muito medo, descaso e irresponsabilidade por parte de muitos que não querem usar máscaras, distanciamento social, como se tudo fosse uma brincadeirinha de mau gosto. Meu coração, porém, é um tabernáculo, onde a solidão desfila todos os dias, todas as horas e todas as noites. Com ela chega a poesia e, em meio a esse turbilhão de pensamentos, me traz versos impregnados de emoção, de saudade, fé e de devoção.
Sou um estranho passageiro da terra, num trem, ao que parece, desgovernado. Quero ver de novo um rosto que se foi para sempre. Não consigo parar a condução. A viagem continua e acontecem coisas inexplicáveis, inconcebíveis. Mas estou consciente: são coisas do verão ou melhor, do coração. Fico debruçado na janela do tempo. Contemplo a imensidão. Descubro a cada dia que o meu olhar é triste. Devo ter caído aqui por engano. Vejo-me por dentro e me sinto um passageiro na agonia do “TITANIC”, o navio que se pensava e propagava o mais seguro do mundo. À deriva no mar de sonhos, navegando com o coração e descobrindo decepções em cada porto do Planeta.

Às vezes, imagino que estou voltando. Mas, por onde já andei? De onde venho e para onde vou? Não sei. Mas sinto dor. Um vazio que dói. A dor de perder pai, mãe, irmãos e ficar sozinho no mundo. Essa dor que desafia os avanços da Medicina. Porque no coração há um sopro de um Deus que existe, mas ninguém explica. Que movimenta todo o Universo num mistério insondável. Lembro-me de Vinícius de Morais: “Se foi pra desfazer, por que se fez?” Mas ninguém responde.

Tudo se transforma. É a lei. Na terra, nada é permanente. Também o ser humano, com sua ternura, sua desventura, seus mistérios e suas limitações. Detenho-me diante da doçura do Nazareno. Esbarro no mistério da vida. No fascínio do mundo espiritual. No mistério da fé. Quisera, como tantos, ter o dom da fé. Será que me perdi nas indagações que fiz pela vida? Nas respostas que não tive? Será que um dia as terei? Enfim, são coisas do verão. Ou talvez, anseios do coração.

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