TRAGÉDIA NO JORDÃO
Filemon Martins
Poucas pessoas conhecem e alguns moradores da região nem
se lembram desta história. Nem sempre com um final feliz, como gostaríamos.
Essa é uma delas. Mas o pesquisador deve registrá-las, sob pena de alguns fatos
se perderem no tempo.
Não deixar que isso aconteça é a missão de quem escreve.
O rapaz viveu boa parte de sua vida na cidade de Jordão.
Não se casou, mas ali trabalhava na lavoura plantando e colhendo milho, feijão,
mandioca, além de frutas como mamão, romã, mangas de várias espécies, limão,
laranjas, melancia, abóboras e outros legumes.
Com o passar dos anos o José foi acometido por uma doença
mental, de tal forma que ele já não suportava conviver na cidade. Não queria
mais contato com seres humanos. A família, mais conhecida como os ¨Bruarcas¨, então,
começou a buscar uma solução para driblar a situação delicada que o destino lhe
impôs.
É que a população da pequena cidade quando se referia ao
moço, chamavam-no de ¨Zé doido¨, o que causava mais constrangimento à família.
Construíram, então, uma casinha na roça, propriedade da
família, onde o moço poderia morar e trabalhar na lavoura, sem a interferência de
curiosos e pessoas de má índole. Assim, o rapaz foi morar afastado da cidade e
do contato com pessoas para ele estranhas. Só alguns familiares o visitavam
para levar-lhe comida e limpar a casa, eventualmente.
Mais de trinta anos se passaram e a vida do moço, agora já
idoso, continuava naquela rotina. Ele não via, nem conversava com ninguém, a
não ser alguns familiares que cuidavam dele dentro do possível. Enquanto isso,
a cidadezinha saiu da escuridão total e passou a ter luz elétrica das 19h às
21h10min no máximo. É que essa luz era gerada por motores elétricos. Aliás, é
bom lembrar que todas as cidades da região tinham esse tipo de iluminação. Por
volta de 21h5min havia o primeiro sinal. A luz piscava e os moradores já se
preparavam acendendo os candeeiros para iluminar as casas. 21h10min a luz
apagava literalmente e a escuridão nas ruas era total.
Quem saía às ruas depois desse horário, usava obrigatoriamente uma lanterna. Era um festival de luzes indo e vindo pelas ruas e praças da cidade, como se fossem vaga-lumes a iluminar a cidade. A mais próxima Usina Hidrelétrica era de Paulo Afonso. A Usina Hidrelétrica de Sobradinho foi construída muito tempo depois, quando a região do Sertão foi finalmente contemplada. N
o mês de junho tradicionalmente de festas no calendário
católico, 13 de junho – Santo Antonio, 24 – São João e 29 – São Pedro, alguns
rapazes decidiram entre si, por brincadeira, trazer o ¨Zé doido¨ para rever a
cidade e de alguma forma participar dos festejos que se realizavam na cidade.
Assim se fez e o Zé estava extasiado com o crescimento da
cidade, quando entrou a noite e as luzes se acenderam, foi aquela aclamação do
povo. Enquanto isso, o Zé andava pra lá e pra cá pelas ruas da cidade, e acabou
se distanciando do grupo, no momento em que as luzes se apagaram. Sobreveio a
escuridão e o Zé perdido, desnorteado, começou a correr pelas ruas sem saber
para onde ir. Corria e andava de um lado para outro, já adentrando roças,
pulando cercas, atravessando pastos e acabou se dirigindo, sem saber, para os
lados de uma cacimba com alguma profundidade, anexa à Lagoa, ainda hoje
existente, e ao pular mais uma cerca caiu naquela cacimba funda, onde se afogou,
sem que ninguém o visse e pudesse salvá-lo. O que era brincadeira tornou-se
sério e o Zé ficou desaparecido naquela noite. O corpo só foi encontrado no
outro dia, quando o pessoal descobriu rastros e se deslocou para o local da
cacimba, onde o corpo estava boiando. Seu sepultamento ocorreu no cemitério
local. Assim terminou a vida do ¨Zé doido¨, aqui na terra, por culpa talvez de
uma brincadeira que acabou mal, como tantas outras que conhecemos ao longo da
vida...
Comentários