COISAS DO CORAÇÃO
Filemon Martins
Hoje acordei contemplativo.
O dia amanheceu escuro, chuvoso e triste. E enquanto chovia, observava as gotas
de água que caíam na vidraça da janela e deslizavam mansamente. Uma saudade
inexplicável bateu forte em meu coração. Lá fora, a chuva continuava fina, mas
constante, ativando ainda mais este agridoce vazio que pesa no meu peito.
Nestes dias parece que a
poesia adquire mais sabor e mais vida, transformando-se num lenitivo para o
espírito. Munido de caneta e papel, começo a escrever. Escrevo com o coração
uma palavra, uma frase sobre um episódio, um fato, um sonho, uma esperança ou
quem sabe a reminiscência de um amor que se perdeu no tempo.
Aos poucos a chuva vai
cessando e eu sinto uma vontade incontrolável de sair pelas ruas do bairro,
andando a esmo. Talvez, eu possa ir à barbearia conversar com as pessoas. Gosto
de ouvir suas histórias, sonhos, segredos e tentar entendê-los.
Por algum tempo, fico
absorto, imaginando, como seria bom, se pudesse ser um pássaro. Poderia voar
livre, como um beija-flor numa valsa delicada e bela em redor das flores.
Poderia, ainda, cantar mavioso, como faz o sabiá nas laranjeiras. Porém, não
sou pássaro e também não sei cantar, mas posso pensar. Meu pensamento é uma
arma. Aliás, única arma do poeta. Com ele posso vencer obstáculos e transpor
montes, rios, vales e oceanos. Posso percorrer o Planeta Terra, porque meu pensamento
não encontra barreiras na propagação da paz, da esperança e do amor.
Depois destas conjeturas,
levanto-me. Fico impaciente e ando de um lado para o outro, vou até a porta da
casa, mas vejo através da janela que a chuva volta a cair. Torna-se forte. A
enxurrada se faz barulhenta. Não posso sair. Volto a sentar-me e meu coração se
acalma. Emudeço. Ouço uma música e volto a escrever – são coisas do coração.
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