ENÉAS ATHANÁZIO
Promotor de Justiça (aposentado),
advogado e escritor. Tem 60 livros publicados em variados gêneros literários. É
detentor de vários prêmios e pertence a diversas entidades culturais. Assina
colunas no Jornal Página 3, (www.pagina3.com.br)
colunas, na revista Blumenau em Cadernos e no site Coojornal - Revista Rio
Total.
Como sabem aqueles
que me honram com a leitura, sou “amarrado” nas coisas brasileiras. Não é por
acaso que conheço este país de ponta a ponta e não só as capitais, mas também
os ínvios e os grotões onde houvesse algo de interesse. Diante disso, é claro
que livros sobre assuntos brasileiros me atraem e desfrutam de minha
predileção.
Foi com intenso
prazer que terminei de ler “Caminhos do Jordão da Bahia”, de autoria de Filemon
Francisco Martins (RG Editores – S. Paulo – 2022), que me foi por ele
oferecido. O Autor é meu correspondente de longos anos, ainda que nunca
tenhamos nos encontrado, e foi irmão do falecido Mário Ribeiro Martins,
laborioso pesquisador literário e meu colega do Ministério Público. Somos,
portanto, amigos escritos, como dizia Monteiro Lobato.
Nas páginas deste
belo livro o Autor está inteiro e registra em traços largos toda sua
experiência de vida, desde o sertão da Bahia até São Paulo e Itanhaém na dura
(e vitoriosa) luta pela vida neste país em que a injustiça social se mostra
quase invencível para aqueles que só podem contar consigo mesmos. Nesse sentido
o livro é quase um memorial, ainda que sem o decorrer costumeiro das obras
memorialistas. O Autor escreve com absoluta sinceridade, fato que transborda
das palavras.
Tudo tem início em
Ipupiara, no sertão baiano, onde a família Martins surge para o mundo. Esse
“monstro horripilante e asqueroso” que deu nome ao antigo Jordão de Brotas
teria sido visto por Pero de Magalhães Gandavo e a ele se referiram Fernão
Cardim e José de Anchieta, além de Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda
que o registraram em suas obras. Dali Filemon lançou asas em busca de uma vida
melhor contando apenas com seu esforço pessoal.
O Autor é dotado
de excelente memória e retrata com detalhes cenas de uma infância já distante.
As aventuras da juventude, inclusive andando pelas copas das mangueiras, feito
macacos, os incidentes escolares, detalhes de São Paulo, de Itanhaém, a segunda
cidade mais velha do país, as viagens, as decepções doloridas que a vida arma,
os perfis de muitos amigos e conhecidos, incluindo figuras típicas com quem
cruzou. Inesquecível a visita à cidade de Pinheiro, no Maranhão, terra de José
Sarney, onde tudo, para qualquer lado, é dele ou da família.
– Aquele edifício
a quem pertence?
– É da filha do
Sarney.
– E aquela casa de
quem é?
– É do filho do
Sarney.
– E aquela
emissora de rádio?
– É do Sarney.
– E aquele jornal?
– É do genro do
Sarney.
– E aquela
empresa?
– É da nora do
Sarney.
Para completar,
uma rádio local repetia sem parar:
– Um
empreendimento José Sarney!
Por sorte, concluo
eu, as almas eram invisíveis. É bem provável que nelas estivesse escrito: Sou
do Sarney!
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